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Cátia: Quero ter direito a escolher o que me faz bem à cabeça

Cátia vive numa aldeia do concelho de Montemor-o-Velho. Jovem adulta, de pequena estatura, cabelo escuro, fino e rebelde, olhos grandes castanhos, redondos e cheios de vida. É comunicativa, com muitas histórias para contar e não permite que a sua presença não seja notada.  

Cátia tem avidez de viver. Toda ela é movimento: salta, corre, dança ou gesticula enquanto fala. Gosta pouco de dormir e entretém-se com facilidade, seja com os animais lá de casa, com jogos, artes plásticas ou através da internet (diz que faz bem à cabeça). 

Do passado recorda a escola, associada à palavra “quase”: “Quase conseguia fazer e ser como os outros meninos, aprender como eles”. “Conseguia fazer quase tudo”. Nessa altura, a relação com os adultos era o mais fácil. Fala com alegria da professora Dalila e da professora Virgínia, com quem aprendeu noções básicas de leitura e escrita. No grupo de Educação Especial, Cátia sentia-se protegida, acarinhada e verdadeiramente integrada. Gostava de ir à biblioteca requisitar livros, que folheava com curiosidade (diz que faz bem à cabeça).  

No entanto, a história era outra no recreio e no autocarro, onde os colegas faziam questão de a lembrar das diferenças que ela já tão bem conhecia. A agressão pelas palavras e os olhares reprovadores doíam-lhe. Não respondia, sentia-se triste, num mundo à parte e sozinha. Mas o regresso a casa, ao seu porto de abrigo, onde sentia a família unida e disponível para ela, fazia desvanecer esse lado negro dos seus dias.  

Cátia é uma romântica, apaixonada pelas novelas, das quais vive intensamente os amores e desamores. Tenta adivinhar o desenrolar da história, idealizando um final feliz para as suas personagens preferidas, partilhando o seu desejo em voz alta. Vibra com os resumos das revistas cor-de-rosa e imagina-se protagonista da história. Lá em casa, todos são obrigados a vibrar também, incluindo os animais, que trocam de nome à mercê dos personagens do pequeno ecrã. 

Vive o seu próprio romance e acredita que seja para a vida. Vê-se com clareza de mãos dadas com o namorado, que não lhe aponta o dedo e não tem ciúmes (diz que faz bem à cabeça). Imagina-se num futuro feliz, rodeada de toda a sua família e com o jovem rapaz.   

A família, pais, irmãos, cunhados e sobrinho, são o seu pilar e suporte. Ambiciona tê-los sempre juntos e por perto, para dar e receber carinho. No futuro quer que cuidem dela e não se imagina sozinha. Este plano já foi idealizado e traçado por todos. Não pretende também valorizar quem a critica ou lhe aponte o dedo. Isso ficou no passado. 

Fala com ambição em tirar a carta de condução, para poder levar a família a passear e ir onde quiser sem depender de ninguém. “Com ajuda eu acho que conseguia”. Segue sem medos, esquecendo o menos bom e focando-se no que diz que “faz bem à cabeça”. 

“Imagens e Histórias: eu mudo, tu mudas e juntos mudamos o mundo” é um projeto da APPACDM de Coimbra. O seu objetivo é contribuir para mudar a representação social da pessoa com deficiência na sociedade, através de histórias e retratos dos seus utentes. Cofinanciado pelo Programa de Financiamento a Projectos pelo INR, I.P., o projeto deu ontem, dia 6 de outubro, início à sua divulgação. Semanalmente, às quartas-feiras, as histórias e retratos vão ser publicados no Diário de Coimbra. Saiba mais aqui.

Fotografia de João Azevedo.

Cátia: Quero ter direito a escolher o que me faz bem à cabeça