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Dora Cecília: A força de 600 gramas

No dia 16 de fevereiro de 1977, nasceu uma menina muito pequena com 600 gramas de peso e 30 cm de altura. Teve vários episódios de convulsões até aos três anos de idade e foi sujeita a vários internamentos e cirurgias. Ficaram para a vida os problemas motores que a confinaram a uma cadeira de rodas. 

A CERCI foi a primeira instituição que a acolheu, aos seis anos, e dela lembra-se muito bem. Mais tarde viria a integrar o Centro de Atividades Ocupacionais (CAO) da APPACDM de Coimbra, onde ainda hoje se encontra. 

O pilar da sua vida é a família. Um grupo alargado onde, para além dos pais e irmão, se incluem o padrinho, a prima, e outros. São um grupo muito unido e preocupado em estar sempre presente nos momentos importantes da sua vida. 

Dora é uma pessoa positiva que retira prazer no observar o mundo à sua volta: as paisagens, as flores, os animais. São coisas que soam como música para os seus ouvidos, dando-lhe uma sensibilidade especial para a poesia. 

Capaz de grandes paixões confessa-se uma benfiquista ferrenha. Com a sua “tribo” (família), e equipada a rigor, vê os jogos mais importantes e vibra com todas as vitórias. 

Boa conversadora, gosta de partilhar ideias e opiniões. Conversar é, para ela, uma terapia, deixando-a mais calma e relaxada. O mesmo acontece quando frequenta a piscina, sentindo que os seus músculos descontraem e não ficam tão tensos. 

Atrás de um sorriso tímido, e até envergonhado para quem não a conhece, Dora esconde uma grande força de vontade e convicção nos seus próprios objetivos. 

Frequentemente quer “voar” para além dos limites que a sua capacidade física permite. 

Tem metas e objetivos e teima em atingi-los. Quis uma cadeira de rodas elétrica para ir onde quisesse e não ser levada, mas uma avaliação técnica determinou que não teria potencial para a conduzir. Teimou e a sua determinação venceu resistências. Treinou intensivamente e tendo “sacrificado” várias esquinas no Centro, acabou por conseguir a almejada cadeira elétrica, a qual chama com orgulho “o meu Ferrari”. 

Dora teve uma vida pautada por inúmeros internamentos hospitalares, cirurgias e desilusões, mas também momentos de superação e otimismo. Para Dora, falar sobre o “antigamente” é como limpar o pó à memória e disso retira grande prazer. 

Quis um dia contar a história da sua vida e fixou o objetivo de escrever um livro. Recolheu retalhos de memória e letra a letra, palavra a palavra, como quem tece uma colcha em patchwork, a obra foi construída. Congregou vontades e apoios e o almejado livro sobre a sua vida surgiu em 2016. 

Mas Dora não para e agora já tem outros objetivos à sua frente. Esta pequena mulher franzina que não consegue ter um controlo eficaz das suas próprias mãos, tem dentro dela uma determinação e crença invejáveis. Dora é a prova que 600g podem ter muita força. 

“Imagens e Histórias: eu mudo, tu mudas e juntos mudamos o mundo” é um projeto da APPACDM de Coimbra. O seu objetivo é contribuir para mudar a representação social da pessoa com deficiência na sociedade, através de histórias e retratos dos seus utentes. Cofinanciado pelo Programa de Financiamento a Projectos pelo INR, I.P., o projeto deu início, no dia 6 de outubro, à sua divulgação. Semanalmente, às quartas-feiras, as histórias e retratos vão ser publicados no Diário de Coimbra. Saiba mais aqui.

Fotografia de João Azevedo.

Dora Cecília: A força de 600 gramas